- Tais Luso de Carvalho
Pois é, a gente vai vivendo, a vida vai passando, e sempre aparecem pessoas que não reconhecemos mais. E os constrangimentos acontecem com mais frequência: de onde conheço esta criatura?
A pessoa sorri, vem falar… Que situação! E o clima do encontro, inevitavelmente cai. Minha tática é ficar enrolando até dar o clique na minha memória.
Pergunto o que ela tem feito, onde está residindo, como estão os filhos (que filhos?), perguntas rápidas à procura de um indício.
Quem é ela, pelo amor de Deus? - pergunto ao meu inconsciente.
Não poderia lhe dizer que o tempo passou e que não a reconheço. O tempo nos transforma, mas seria indelicadeza.
Existem pessoas que ao envelhecer conservam os mesmos traços; a mesma fisionomia, às vezes mais bonita, como foi o caso de Caetano Veloso.
Tenho uma tia incrível, a tia Isolda. Estávamos num supermercado, no recanto dos vinhos. Estava um pouco afastada dela, mas vi um senhor lhe fazendo uma consulta sobre os vinhos e me aproximei um pouquinho. Esse senhor lhe estendeu a mão para agradecer a dica, e perguntou:
- Dona Isolda, a senhora não está me reconhecendo?
Tia Isolda, mais do que depressa:
- Tais, olha só quem está aqui!! hahaha...
Assim mesmo, bem fingida e desnorteada, transferiu o drama para mim.
Consegui reconhecer a criatura, era o seu antigo vizinho! Reconheci o homem pela boca - tinha uma boca de peixe Baiacu! Não tinha como esquecê-lo. Não sei o que acontece, mas quando reconheço alguém é pela boca ou pelos dentes! Acho que me daria bem se trabalhasse num necrotério. Sou atenta a muitos detalhes, então salvei a titia da enrascada.
Porém, maior vergonha passei com minha melhor amiga de colégio que há muitos anos foi morar em Belo Horizonte. Casou-se e ficou por lá. E, com os filhos já adultos e formados, a família resolveu voltar para Porto Alegre. E certo dia, numa confeitaria...
- Oie, Taiiiis!!! Como estás amiga? Não estás me reconhecendo?
Meu Deus do Céu, fiquei olhando para ela, meio desnorteada.
- Pois é né...
- Sou a Claudinha!
- Báh, trocaste a cor dos cabelos, ficou difícil !
Nossa Senhora!! Piorou, foi um desastre. A amiga engordou uns 30 quilos, as feições já não eram as mesmas e dei a desculpa dos cabelos? Foi trágico, embora minha intenção fosse boa.
Muito difícil esses encontros... a vida vai passando e a memória pouco ajuda. Nem a boca, desta vez, reconheci!
Peixe Baiacu - vizinho da tia Isolda...